sexta-feira, 2 de março de 2012

Ele

Ele está sentado na cadeira dura de madeira, aguardando a sua vez de ser chamado. O olhar distante, perdido em pensamentos que jamais saberemos, talvez dúvidas, certezas ou medos. Suas mãos tremem segurando sua bengala, e toda vez que escuta alguém reclamar, vira lentamente seu frágil corpo em direção à pessoa, e a observa com toda a sua limitação. Então, vagarosamente ele retorna a sua posição inicial, arrumando-se na desconfortável cadeira que o castiga, fazendo seus bicos de papagaio e desvios de coluna, gritarem. Apesar de tudo ser tão difícil para ele, pacientemente ele aguarda a sua vez. 

E então o médico abre a porta do consutório e chama o seu nome. Seu acompanhante levanta-se rápido e o apressa para entrar logo no consultório e não atrasar a consulta dos demais que aguardam. Ele levanta lentamente, com grande esforço, suas pernas não querem mais ajudá-lo, afinal de contas, nessa idade, limite é uma palavra que o acompanha. Dá o primeiro passo e se firma com a bengala no chão para poder continuar caminhando. Devagarinho e trêmulo, arrastando os pés, ele consegue se locomover bravamente em direção à confortável cadeira, que o aguarda, dentro do consultório médico. Ele pára na porta do consultório, troca a mão da bengala, e com um sorriso banguela, a estica para o médico, sempre mostrando gentileza. O médico o retribui com um aperto de mão e um sorriso no rosto.

Com todas as suas dores, ele continua o longo caminho até a cadeira, e então senta satisfeito como se acabasse de vencer um grande obstáculo para chegar até ela, soltando um suspiro de alívio. As dores cessaram por enquanto. E então, quando ele pensa que a conversa vai começar, alguém começa a falar por ele, descrevendo seus sintomas e suas doenças, invadindo a sua privacidade, a sua vida sem pedir licença. E ele quase não consegue ouvir sobre o que falam, apenas sabe que é sobre ele. O que será que estão falando? De repente, sente um cutucão no braço, tão forte que lhe doeu na alma, e então a sua acompanhante pergunta se ele prefere tomar a medicação em forma comprimidos ou líquidos, já que o que sobrou de seus dentes, não lhe ajudam mais a mastigar. Ele já não tem mais tantas escolhas, e com os ombros, faz sinal de que é indiferente. Os anos lhe pesam nas costas, toda sua vida exposta para pessoas que ele não escolheu.

E após conversas e sorrisos, duas pessoas decidem sem o seu consentimento, o que é melhor para ele, e nem sequer perguntam a sua opinião. Ele quer falar, mas sabe que as pessoas não tem tempo para ouvi-lo. Tudo anda tão rápido e ele já não consegue mais acompanhar. Então ele se cala e aceita que as coisas não vão melhorar, que a sua juventude já se foi, e que a sua sabedoria e experiência de vida, poucas pessoas irão querer conhecer. Sua companhia são as lembranças, que o fazem ficar tristes, por estarem cada vez mais distantes. Ele se conforma, e espera que dias melhores venham amenizar a sua dor.

Até mais!


2 comentários:

  1. Que lindo esse texto amor! Ficou muito bom mesmo! É uma bem descrita imersão no mundo dos idosos que são obrigados a acompanhar um ritmo de vida que eles nunca tiveram, o que por si só, já seria difícil, imagine com a velhice. Muito legal mesmo!

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  2. Obrigada amor...a velhice é cruel em todos os sentidos, mas é o futuro da maioria. Então devemos enfrentá-lo da melhor forma possível, com bastante paciência, vivendo um dia de cada vez.

    ;)

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